quarta-feira, 1 de abril de 2015

Duas estrelas

(onde se fala dos dois protagonistas de um espectáculo de ballet)

 

Neste dia, para mim, houve duas estrelas. Os meus olhos tentavam acompanhá-las a ambas, admirados. Encantados. Nunca tinha visto nada assim, em palco e na plateia.

O Vasco, sob os holofotes, parecia outro. Transfigurou-se. Se nos ensaios estava sempre uns segundos atrasado e tinha de seguir a meninada, ali, não falhou um passo. E tão nervoso que ele estava, antes de entrar! Percebi que os cinco anos de audições de violino deram-lhe um à-vontade em palco que as colegas não possuíam. Um autocontrole conquistado à custa de muito treino. Uma capacidade de se transcender. Mas a idade agora é outra. A coisa pequena já não sobe ao palco com a mesma descontracção. Sente a necessidade de fazer bem feito, de fazer bonito. De dar espectáculo. Daí os nervos iniciais, que o Vasco soube perfeitamente controlar. Foi, de facto, bonito de se ver. O ar sério, compenetrado. De miúdo crescido. O corpo leve, de bailarino. Os passinhos. O tempo.

Na plateia, o meu amor dormitava exausto. O dia tinha sido longo, sobrecarregado de compromissos em Liège. Sem carro, apanhou todos os transportes públicos possíveis, numa corrida contra o tempo para ver o Vasco dançar. Consegui ir buscá-lo à estação de comboios mais perto, mesmo em cima da hora. Quando anunciaram a turma do Vasco, o meu amor despertou de repente. Pegou na máquina fotográfica e saltou lá para a frente, sem uma palavra. Na penumbra, consegui vê-lo a procurar o ângulo perfeito. A seguir, em suspenso, os movimentos. A parar de fotografar e de filmar por momentos, apenas para contemplar a coisa pequena, longe da objectiva. E ver o Vasco dançar tão bem através dos olhos e da emoção do meu amor foi outro espectáculo em si. É ser amada também através do amor que os meus filhos suscitam.



 


 
 
[ adoro este pequeno vídeo apenas pelos passinhos delicados do Vasco quando saiu de cena, depois da primeira apresentação... ]

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