quarta-feira, 10 de setembro de 2014

E o que me apraz dizer, depois da primeira aula de ballet?

(ou como entrar com um elefante numa loja de porcelanas

e sair de lá surpreendido)


Este ano decidi fazer uma exigência não negociável no que toca às actividades extracurriculares dos rapazes: podiam escolher o que quisessem, desde que fosse perto de casa. Acabou-se aquela correria louca contra o tempo dos anos anteriores. Mantiveram o solfejo e os instrumentos. Trompete para o Diogo, violino para o Vasco. O Diogo decidiu começar a tocar outro instrumento e escolheu o violoncelo. Desconfio que o Vasco vai querer imitá-lo... Quanto ao desporto, também mantiveram a equitação. Mas lá consegui convencê-los a terem aulas a sério num picadeiro. Assim, já não estamos condicionados pelo clima e o Vasco pode começar a andar sozinho num pónei, porque estão num circuito fechado. Nada nos impede de darmos uns passeios a cavalo pelos bosques de Malempré com a Myriam, quando tivermos saudades.

Como o Diogo escolheu a opção de desporto na escola, achei que já chegava de actividades desportivas. Também há que dar descanso ao corpo. Excepto no caso do Vasco, claro. Nada parece cansá-lo. É imparável e inesgotável. Um poço sem fundo de energia bruta. Literalmente bruta. Portanto, decidi inscrevê-lo em mais uma actividade desportiva. Algo que o obrigasse a concentrar-se e a canalizar aquela energia toda. Que o deixasse de rastos. É verdade que ele adorou a esgrima, no ano passado… mas tenho sempre medo que ele vaze um olho a alguém, quando o vejo a esbracejar com as espadas improvisadas que vai desencantar sabe-se lá onde. E, tendo em conta a sua paixão assolapada por duelos e lutas e guerra e batalhas, estava fora de questão qualquer tipo de arte marcial. Ainda me dava cabo de um colega antes de chegarmos ao Natal. Tinha de ser algo exigente fisicamente, mas calmo. Muito calmo. As opções, na zona de Vielsalm, não eram enormes. Mas havia o ballet…

No ano passado chegámos a falar nisso, só que o Vasco teve vergonha e acabou por não querer ir. Mas depois arrependeu-se, quando viu que o filho do professor de violino andava no ballet e gostava muito. É de dizer que o Matteo é um miúdo tão reguila como o Vasco. Por isso, este ano voltei à carga. Para vencer o preconceito e ver se o interessava, mostrei-lhe no YouTube uns vídeos do Marcelino Sambé, um miúdo que sigo com interesse. O Vasco gostou muito e quis experimentar. E hoje lá fomos os dois, com ele todo contente de leggings pretos. À chegada, só meninas de maillots e saias cor-de-rosa. E uma professora imponente. O Vasco fez-se pequenino e escondeu-se nas minhas costas, envergonhado. Perguntou à professora se eu podia ficar a assistir. E ainda bem, porque passei uma hora absolutamente deliciosa. Nunca na minha vida tinha visto algo assim. Sempre imaginei que dar aulas de ballet a miúdos pequenos devia ser como ensinar um bando de elefantes desengonçados a dançar harmoniosamente. Mas, não. Aos poucos há uma espécie de transformação qualquer que se opera sem nos darmos bem conta. O corpo endireita-se, alonga-se. Ganha plasticidade e doçura. Os movimentos tornam-se fluídos. Ao fim de uma hora, a minha coisa pequena já conseguia seguir as meninas. Meio desengonçado, meio desastrado. Mas… como explicar… contido. Concentrado. Calmo. Bonito.

Não sei se o Vasco vai querer continuar as aulas de ballet, só ele pode decidir. Eu gostava muito que continuasse, adorei vê-lo. Fiquei absolutamente fascinada com o que aquela mulher conseguiu fazer em tão pouco tempo. Por enquanto, ele diz que quer voltar. Para experimentar mais uma vez. Só espero que lhe volte a dar um ataque de vergonha e peça para eu ficar…
 
E, para quem não conhece, eis o Marcelino Sambé...

 

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