quarta-feira, 23 de abril de 2014

Maninho

(onde se vislumbra uma história com um enredo surreal e se narra outra)


Somos quatro. Três raparigas mais velhas e um rapaz. Sendo que eu sou a sandwich do meio. Entre nós, temos três mães e dois pais. Avós, perdi-lhes a conta. Parece complicado? Se vos explicasse, iria ficar ainda mais complicado, acreditem. Isto só lá vai com um desenho. E o melhor é não o deitarem fora, porque pode sempre dar jeito para consultas posteriores. O meu amor já conheceu a família toda – e honra lhe seja feita, não fugiu a correr – mas, no outro dia, perguntou a medo quem eram os pais da minha irmã mais velha. Acrescentou muito depressa que sabia, só que estava um bocadinho baralhado. E eu percebi logo que, quase um ano e meio depois, o tipo não percebeu patavina.

Tudo isto para apresentar mais uma personagem importante desta nossa história: o Pedro. O meu irmão que fez ontem mais anos do que aqueles que eu consigo acreditar que ele tenha. O meu irmão que nasceu num Domingo de Páscoa, tinha eu oito anos. Nunca tinha visto um bebé tão bonito e foi paixão à primeira vista. Dizem-me que tive alguns ciúmes, mas sinceramente não me lembro. Lembro-me apenas de o amar com o primeiro amor incondicional que senti na vida. Até hoje.

Mal começou a andar, levava-o para todo o lado. Aos sábados de manhã, o meu pai dava-me dinheiro para irmos tomar o pequeno-almoço ao café para eles poderem ficar a dormir mais um bocado. O Pedro acordava com as galinhas. E nós lá íamos. Às vezes, quando eu tinha conseguido juntar várias mesadas, percorríamos a Estrada de Benfica os dois de mão dada para irmos comprar uns “Pinypon” a uma papelaria onde eram mais baratos. Ele andava quilómetros a pé e nunca se queixava. Tinha uma energia inesgotável. Estava sempre com fome. Lembro-me que a minha avó Clarisse aflita lhe suplicava que parasse de assaltar a dispensa porque ia acabar por ficar doente. A hora dos desenhos animados era sagrada. Tal como as aldeias de “Barriguitas” que eu construía na marquise e que ele adorava destruir quando eu estava na escola. Quando o Pedro fez seis anos, realizei um sonho antigo de o levar comigo para a colónia de férias. Passou quinze dias sem tomar banho, a seguir-me como uma sombra para todo o lado. Jurei para nunca mais. Mas quando fiz um ano de intercâmbio na Bélgica, foi dele que senti mais saudades.

Era um miúdo mimado e malcriado, mas eu adorava-o. Transformou-se num adolescente irritante e eu continuei a adorá-lo. Hoje é um adulto cheio de certezas e eu adoro-o cada vez mais. É um excelente irmão e um tio fantástico. Os miúdos têm uma paixão assolapada por ele. Finalmente, o Pedro vem viver para mais perto de nós e vou poder ir visitar mais vezes o meu maninho que se fez grande sem eu dar por isso. Há uns tempos, disse-me que se os rapazes passassem umas férias sozinhos com ele, vinham de lá bem-educados e a andar na linha. Eu larguei a rir, aliviada por perceber que afinal ele não cresceu assim tanto como isso…

Sem comentários:

Enviar um comentário